quinta-feira, 24 de setembro de 2009

Maçãs e pinhões... outras receitas...

E eis que volto para cima da montanha. Ali, onde a nuvem nos envolve e deixa branco o horizonte. Ali, onde o silêncio repentino é prenúncio de neve, de frio, de gelo.

Em ambiente pessoal não houve mais porque abrir tanta porta, deixar entrar quem não se conhecia. Em ambiente pessoal deu-se tempo para reencontros – planejados ou surpreendentes.

De volta à paisagem primeira da minha educação, do meu afeto primeiro, reconheço palavras, expressões, abraços, simpatias e antipatias. Ah, esses pre-conceitos! Tão bons quando deitados por terra. A vida antes mal-olhada, agora, no repente, é apreciada. Se antes o gosto era o que definia, agora era a oportunidade de experimentar que poderia me mover.

E a aventura contava com duas grandes companhias. Pequenas ainda, carentes de zelos e cuidados. Mas que abriam todos os sentidos para a vida. E a vida vinha. E a gente acolhia. E se aventurava nas propostas da avó que se revelava não só companhia, como incentivadora das novidades.

Acolhemos o queijo, a maçã e o pinhão na lareira da sala.
Acolhemos vizinhança quase familiar.
Acolhemos proximidade da escola.
Acolhemos as primeiras incursões no mundo dos esportes.
Acolhemos os primeiros tombos de bicicleta (sem roda extra).
Acolhemos o fogo que precisava se manter aceso para vencer o frio.
Acolhemos pinturas expostas pelas paredes da casa.
Acolhemos o cão que a tudo lambia.
Acolhemos o zelo por um jardim dado pela avó.
Acolhemos a brasília antiiiiga (o melhor carro do mundo).
Acolhemos as novas e antigas visitas.
Acolhemos viagens.
Acolhemos a surpresa diante das nossas vidas.

E o riso construiu não só os meses subsequentes, mas deu esteira para qualquer dificuldade.

A prática em excesso – em trabalho inesperado, prazeiroso e assustador – trouxe a certeza de que era possível sobreviver ao caos, e que o estado caótico de minha vida não era nem uma parte do caos de tantos que sobreviviam.

Além do sofrimento havia raiva, havia gana, havia nojo, havia sede. Além das leis, havia a convivência, o afeto, o riso gratuito. Além do limite do dia a dia, havia excesso nos brinquedos e nas brincadeiras. E vamos denunciando o nosso jeito de “comprar” a des-culpa de fazermos parte de uma sociedade que não tem espaço para fracos, débeis, machucados, doloridos.

Mas houve tempo de modificações, em que era necessária a interferência externa. E a submissão a ela trouxe maior reflexão. Não mais seria possível ali, mas daria para vivenciar superação de sofrimento em outros lugares, em outras receitas, com os mesmos ou com outros ingredientes.

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